quinta-feira, 16 de julho de 2009

Artigo Indefinido – Ano 1 – Nº 42

Avenida Paulista – Década de 1970

Aqui do alto,
Onde o prédio domina
E a janela escura inibe a luz natural,
A rua parece um artifício,
Um jogo extravagante e monótono,
Onde o revezamento dos participantes se dá de forma peculiar, estranha,
Como se o vencedor, depois de tudo, se esforçasse por externar sua vitória, quando descobrisse sua condição inalienável de vencido.

Aqui do alto,
Onde o tédio domina,
Vê-se a sucessão de semáforos intermináveis e inabaláveis em sua sanha impotente de manter o fluxo de veículos como alguma coisa coerente e democrática;
Piscando, esses semáforos, intermitentemente,
Às vezes em ondas, quando sincronizados,
Ora destrambelhados, anárquicos, quando suas sintonias não coincidem com o que o próprio tráfego entende por sintonia;
E comandam o trânsito, solenes,
Apagando e acendendo, mesmo que esse trabalho nada mais represente do que simplesmente apagar e acender como um luminoso vulgar.

Aqui do alto,
Onde o medo domina,
As motocicletas com escapamentos abertos ou as buzinas de carros impacientes se mesclam ao barulho do vento que estremece as persianas, e aos arrulhos das pombas namorando nas marquises do prédio ao lado;
Há também as zoadas das sirenes de ambulâncias e bombeiros e polícias, e os ruídos típicos de uma construção de um edifício próximo,
Além do pipoquear de uma solitária máquina de escrever, interrompido bruscamente por uma freada de automóvel que chega aqui em cima estridente como um grito.

Aqui do alto,
Onde o prédio, o tédio e o medo dominam,Tudo se resume numa mágica bizarra de se perceber o burburinho da vida como um jogo de cenas sobrepostas, que não se chocam, independente da interferência inócua de estarem sendo observadas aqui do alto.

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