quinta-feira, 23 de julho de 2009

Artigo Indefinido – Ano 1 – Nº 43

Fanny Ardant, grande atriz francesa, que foi mulher do famoso diretor francês François Truffaut no início da década de 1980 (ele faleceu em 1984, se eu não estou enganado), dirigiu um filme recentemente, aos 60 anos de idade, porque estava com muito tempo livre, conforme matéria publicada no encarte EU&Fim de semana do Jornal Valor Econômico no fim de semana passado. Uma das características da atriz e agora diretora, informada na matéria do jornal, é a de não assistir TV e não ler jornais, por isso o tempo de sobra. Diz ela que se informa sobre o que acontece em seu país e no mundo pelo que ouve de seus amigos. Achei isso espantoso. Como viver num mundo como esse de hoje, em que as notícias e acontecimentos chegam por tantas vias, tomando a decisão de não assistir ou ler? Será que ela também não lida com computadores, telefones celulares, palmtops, e toda essa parafernália da qual nos tornamos tão dependentes? Imagino que ela não deve ser aquele tipo de pessoa que tem que se “internar” para poder se desligar do seu blackberry. Ela não deve ter esse tipo de vício (termo correto para a dependência que criamos em relação aos nossos gadgets eletrônicos). Confesso que me sinto desconfortável se tenho que sair, mesmo que seja só para ir até a padaria mais próxima, sem levar o telefone celular. Mas ao mesmo tempo, já sinto um pouquinho de impaciência com a avalanche de novas informações, novos comandos, e outras novidades que os aparelhinhos trazem. Um exemplo prático é minha pouca vontade em tentar entender o amontoado de siglas que definem o aparato de uma TV de LCD atualmente. Sinto um pouco de preguiça em tentar desvendar os mistérios que há por trás dessas abreviações. Há pouco tempo atrás estive num shopping, para almoçar, e vi um vestido que serviria como um presente de aniversário para a Vanja, minha cunhada. Queria uma opinião da Fatima, minha mulher, sobre ele, mas não atinei, de cara, como fazer isso. Depois de um dia ou dois lembrei-me que meu telefone celular tem câmera fotográfica, o que seria um pouco óbvio para os mais jovens, mas não foi para mim. Tirei a foto do vestido, mas fiquei em dúvida sobre se a foto realmente tinha ficado registrada ou guardada (não ficou na tela esperando por um comando de “salvar”, ou coisa parecida, como em circunstâncias anteriores – com aparelhos mais antigos). Então parei por alguns instantes e comecei a fuçar para ver onde a imagem tinha ido parar. Premi alguns comandos do telefone, mas encontrei um pouco de dificuldade na busca. A (jovem) vendedora, apreciando a situação por trás do seu balcão, perguntou-me se eu tinha filhos. Eu disse que não. Ela então me disse que um filho já teria achado a foto. Aquilo mexeu com meus brios. Fucei mais um pouco, já com um pouco mais de ansiedade e impaciência, e descobri que o maldito aparelhinho guardava as imagens fotografadas automaticamente no cartão de memória (que eu nem sabia que estava ativo, apesar de saber que estava lá). Havia a possibilidade de guardar a imagem na memória do próprio telefone, mas ele já esteve pré-programado para arquivar (ou, modernamente, “salvar”) no cartão de memória. Foi um pequeno e chocho triunfo ter conseguido achar a foto sem auxílio externo, mas a sensação foi mesclada com um sentimento de premonição quanto ao futuro: por quanto tempo ainda vou conseguir acompanhar a evolução tecnológica? Hoje, no Caderno 2 do Estadão, Luiz Fernando Veríssimo conta, com a graça habitual, que se confunde com as torneiras do chuveiro (lembro de ter lido uma outra crônica dele em que ele dizia que mal entendia como um prosaica torneira funcionava, quanto mais um aparelho eletrônico qualquer!), porque antigamente elas tinham as letras F e Q para informar que se tratavam das torneiras de água fria e quente, respectivamente. Ou então, sem as letras, havia as cores azul (fria) e vermelha (quente). Agora sobraram duas torneiras idênticas (em hotéis, imagino), sem letras ou cores. Há uma ordem entre elas, mas ele esqueceu qual é (e eu também não sei): a da esquerda deve ser de água quente e a da direita a de água fria. Ou vice-versa. Quem sabe? E assim, me identificando com esse tipo de situação, cada vez mais vou me aproximando da minha mãe, cujo telefone celular serve exatamente para telefonar para os outros, ora fazendo, ora recebendo ligações. E só. Nada de convergência digital: um aparelho de telefone que concentre máquina fotográfica, tocador de músicas, sintonizador de rádios (em alguns casos, de TV também), agenda de telefones e endereços, agenda de compromissos, GPS, acessador de internet/e-mail, e por aí vai. Não sou aquele tipo de saudosista que sente saudade da máquina de escrever manual (que alguns jovens nem imaginam do que se trata, porque nunca viram). Era mais romântico, mas, em contrapartida, dava um trabalho danado. A evolução é bem vinda. Pena que chega um tempo em que ela vai acelerar e nós vamos ficar, inevitavelmente, para trás. Nos falamos.

3 comentários:

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  2. Bom, aos 25 eu já perdi a paciência com tanta tecnologia. Aliás, detesto telefone celular. Meu chefe vive reclamando que não atendo o meu. Acho que as coisas que foram feitas pra nos dar tempo se multiplicaram tanto que acabam nos tomando grande parte do tempo que, supostamente, deveriam nos conceder!

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  3. Adorei! Também acho que um pouco de novidade e tecnologia cai bem, mas essa overdose atual me desnorteia, rs. Para a "galera" que está crescendo simultaneamente ao avanço da tecnologia é tudo muito natural. Eu me assusto ao ver como o Gabriel manipula o notebook como se soubesse o que faz!!
    Nos falamos.

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