quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Artigo Indefinido – Ano 1 – Nº 15

Rio de Janeiro, 1972. Num boteco do Leblon estão sentados e - naturalmente - bebendo, Chico Buarque, Mário Prata e Eric Nepomuceno. O primeiro dispensa apresentações e os outros dois são escritores. Mário Prata, ótimo cronista, foi quem publicou a crônica sobre a morte do Fabinho, no Estadão, em Outubro de 2003. Discutem sobre a realização de uma peça de teatro. O Mário diz para o Chico que a parte musical cabe exclusivamente a ele, Chico, já que ele próprio, o Mário, desafinava até para cantar “parabéns pra você”. Eu sou aquela pessoa, disse o Mário, que as crianças até olham para trás, durante o “parabéns”, para saber quem está cantando daquele jeito. O Chico não acreditou. Ninguém podia ser tão ruim assim. Insistiu para que o Mário cantasse ali mesmo o “parabéns”. Aí o Mário não se fez de rogado e começou a cantar, e o Chico a prestar atenção. O Mário então se entusiasma e canta o “parabéns” inteiro, em alto e bom som. Sem que eles se dessem conta, o bar começou a ficar em silêncio, afinal o Mário Prata estava cantando “parabéns pra você” para o Chico Buarque, que escutava atentamente. Quando o Mário acabou de cantar, grande parte das pessoas que estava no bar aplaudiu. Aplaudiu o Chico, não o Prata, afinal ele era o aniversariante. As pessoas foram até a mesa deles para parabenizar o Chico, o dono do bar mandou uma rodada por conta da casa, amigos avisaram outros amigos, o bar encheu, e todos vararam a noite naquela comemoração. Saiu até na coluna do Zózimo Barroso do Amaral, no dia seguinte. E faltavam pelo menos uns seis meses para o aniversário do Chico. Essa historieta, e muitas outras semelhantes, faz parte do livro “Minhas mulheres e meus homens”, escrito pelo Mário Prata e publicado em 1999 pela Editora Objetiva. Estou relendo como forma de desanuviar a mente, depois de passar pela densa história de “Dois irmãos”, do Milton Hatoum. E aí me veio à mente uma história parecida, mas que não teve a participação de qualquer celebridade, que eu não posso deixar de contar. Não sei precisar quando ocorreu, mas é coisa aí entre quinze a vinte anos atrás. Juntamos eu e a Fatima, o Zé Carlos e a Lúcia e o Roberto e a Sílvia, e resolvemos ir a um restaurante de comida nordestina, o Andrade, na Rua Artur de Azevedo, uma travessa da R. Henrique Schaumann, em Pinheiros. Além da comida típica, também havia música ao vivo. Chegamos depois das onze horas da noite e tivemos que esperar um bocado por uma mesa. De maneira que só entramos e sentamos por volta da meia-noite (será que ainda tem hífen?). Para nossa surpresa, a banda que tocava música nordestina parava naquele instante de tocar, e a música passava a ser sertaneja. Não era o que pretendíamos, mas tudo bem. A uma certa altura, pensando em agitar um pouco a situação, e sabendo que o Roberto não era propriamente um fã de música sertaneja, me levantei e disse para os outros que iria ao banheiro. Em vez disso, fui até a banda e perguntei como poderia oferecer uma música. Um deles me informou que bastava escrever num pedaço de papel e encaminhar pelo garçom. Peguei um guardanapo de papel, uma caneta e escrevi: “Fio de Cabelo” para Roberto de Nápoli. Mas aí embatuquei: a coisa toda ficou estranha. Um homem oferecendo uma música para outro homem, essas bobagens. Então, sem outra inspiração, escrevi, complementando, “pelo aniversário”, e voltei para a mesa. De repente a banda parou de tocar e o cantor informou, para o restaurante inteiro (que não era pequeno, contando até com uma pista de dança em frente ao palco), que havia naquela noite um aniversariante. E anunciou bem alto: Roberto de Nápoli. O Roberto ficou pálido e olhou para mim, como se perguntasse: o que está acontecendo? Aí a banda atacou um vigoroso “parabéns pra você”, acompanhada do coral de vozes dos outros frequentadores (sem trema), e a gente rindo até não mais poder. Eu mesmo havia sido pego de surpresa pela inesperada reação em cadeia, mas o que se podia fazer? Ainda teve o anúncio que seria servida champanhe na nossa mesa, por conta da casa, e quando um garçom se dirigiu para nós com uma gloriosa garrafa da mais autêntica cidra, o gerente da casa fez com que ele voltasse: eles haviam prometido champanhe! Fizemos um brinde e continuamos a rir muito, até que meu maxilar quase travou, doendo de tanta risada. O Roberto prontamente prometeu vingança e disse que não deixaria mais que eu fosse sozinho ao banheiro, o que, afinal de contas, não seria uma atitude das mais másculas, mas fazer o quê? Prevenir é melhor do que remediar. Nos falamos.

2 comentários:

  1. Adorei, Tio Beto!
    Que situação, hein...
    Saudades..
    Beijos,

    Lívia

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  2. Muito hilario.....mas deve ter sido muito divertido!!!!!

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